A nossa classe política é um aborto
Dia 11 de Fevereiro os portugueses vão ter de pronunciar-se em referendo sobre o aborto.
Vão ter de responder a uma pergunta que encerra várias questões que os obrigarão a decifrar e a esmifrar quais os principais valores em jogo. Valores que muitos não conseguirão encontrar por si só. Vão ter de decidir sobre uma pergunta que dividirá o país. Vão andar dias e dias em campanhas populares de degladiação mútua. Vão ter de decidir por um Governo e pelos partidos politicos com assento na Assembleia da República, sobre uma matéria que poderia ter provocado clivagens nas várias forças políticas. Mas não provocou. Inclusivamente, e com a excepção do PSD, todos os partidos políticos apresentam uma posição oficial. Assim sendo, qual o sentido deste referendo? Se a esmagadora maioria dos partidos politicos conseguiu definir uma posição oficial, porque razão pedem a opinião dos portugueses numa matéria tão delicada e melindrosa para a qual eles deveriam assumir as responsabilidades? Todas as responsabilidades. E ajustar no parlamento uma lei que envolve múltiplas questões às quais qualquer que seja a resposta vencedora à complexa pergunta do referendo estará longe de ser totalmente esclarecedora e inequívoca.
Vão ter de responder a uma pergunta que encerra várias questões que os obrigarão a decifrar e a esmifrar quais os principais valores em jogo. Valores que muitos não conseguirão encontrar por si só. Vão ter de decidir sobre uma pergunta que dividirá o país. Vão andar dias e dias em campanhas populares de degladiação mútua. Vão ter de decidir por um Governo e pelos partidos politicos com assento na Assembleia da República, sobre uma matéria que poderia ter provocado clivagens nas várias forças políticas. Mas não provocou. Inclusivamente, e com a excepção do PSD, todos os partidos políticos apresentam uma posição oficial. Assim sendo, qual o sentido deste referendo? Se a esmagadora maioria dos partidos politicos conseguiu definir uma posição oficial, porque razão pedem a opinião dos portugueses numa matéria tão delicada e melindrosa para a qual eles deveriam assumir as responsabilidades? Todas as responsabilidades. E ajustar no parlamento uma lei que envolve múltiplas questões às quais qualquer que seja a resposta vencedora à complexa pergunta do referendo estará longe de ser totalmente esclarecedora e inequívoca.
9 Comments:
Discordo. Seja qual for o resultado da vontade dos portugueses, é um assunto demasiado "transversal" para que possa (ou deva) ser decidido na AR. Quanto aos partidos darem a sua opinião oficial, é um assunto sobre o qual são livres... assim como os militantes são livres de o seguirem ou não...
Viva o voto secreto!
Tão transversal que vai permitir aos portugueses decidir o que os vizinhos podem ou não fazer...
Todas as leis que são criadas, acabam por dizer aos vizinhos, o que eles podem ou não fazer. Por exemplo, se a lei penal diz que é proibido matar, está a dizer ao teu vizinho, que é proibido matar. Não vejo onde está a diferença.
Todas as leis, nos entram pela porta adentro, sem que tenhamos de as aprovar ou, sem que tenhamos de concordar com elas.
No caso do aborto, o problema é mais complicado, uma vez que extravaza o conceito da lei e entra no domínio do binómio moral/religião. É aí que está a diferença e a necessidade de chamar os eleitores a pronunciarem-se.
Nota, que até agora, ainda não disse qual é a minha opinião relativamente ao problema concreto que vai a referendo, até porque ainda tenho sérias dúvidas sobre qualquer uma das respostas possiveis.
Tenho de discordar em absoluto do Gato. Há matérias, como são exemplo as penais, que não são passíveis de referendo. Se o senhor perguntar à população se gostava que a pena de morte em Portugal entrasse em vigor, provavelmente teria como resultado um enorme "sim". A população não tem legitimidade para "votar" em determinadas matérias e, por isso, temos a AR. Além disso, esta questão além de penal é ética e não moral (esqueceu-se do que é a secularização e a divisão entre Estado e religião?).
Tentando responder ao Jerico. O problema, parece-me, reside na cobardia dos partidos que têm estado no poder. Como não houve coragem para decidir na AR sobre esta questão (de levar à AR) e, possivelmente, perderem alguns votos com essa decisão, optou-se pelo referendo. Aquando do primeiro referendo, se bem se lembram, o PR veio sensibilizar a população para que fossem votar, uma vez que só existindo mais de 50% de votantes é vinculativo o resultado. De outro modo, portanto, essa matéria seria decidida em AR. Ora, como também todos se devem lembrar, não houve mais do que 50% de votantes e, por isso, apesar do "sim" ter tido mais expressão não foi um resultado a ter em conta. Ou melhor, não devia ter sido levado em conta. Acontece, porém, que se preferiu fingir que os portugueses estavam-se a marimbar para a questão e "ficou tudo na paz do senhor", não se tomando qualquer decisão neste campo. O porquê? Só vejo a justificação no medinho dos índices de popularidade. Este referendo é uma patetice pegada, embora pense que vá ganhar o sim.
"Todas as leis, nos entram pela porta adentro, sem que tenhamos de as aprovar ou, sem que tenhamos de concordar com elas."
Exactamente... e nesta matéria, havendo posições oficiais de quase todos os partidos(ao contrário do que aconteceu da 1º vez) não se justifica o referendo e a decisão podia ser tomada no parlamento.
(mas não sou contra os referendos, seja qual for a matéria, na medida em que dá a oportunidade dos portugueses escolherem o que querem)
"No caso do aborto, o problema é mais complicado, uma vez que extravaza o conceito da lei e entra no domínio do binómio moral/religião".
Discordo.É precisamente para não haver extravasamentos à lei que se referenda a hipótese de alterar ou não a lei actual. Tudo terá de ficar contido e definido na lei.
Por outro lado não entendo como é que manter ou alterar a lei, afecta as convicções morais ou religiosas de cada um e que obviamente devem ser respeitadas.
E é para as respeitar que não faz sentido impor as minhas convicções morais ou religiosas às dos outros.
Imposição que só acontecerá com uma das opções de voto.
Lua
Há alguma matéria que a população não tenha legitimidade para votar???? Num regime democrático???? Não entendi. Importas-te de explicitar o teu ponto de vista?
Por outro lado, irrita-me o facto de se fazerem sistemáticamente referendos sobre o mesmo assunto, até que se obtenha o resultado pretendido. Mas pronto, o argumento de não terem votado 50% dos eleitores, é justificação para alguns.
Já agora isso levanta outra questão. Se por acaso houver uma AR que não seja votada por 50% dos eleitores, deixa de ter legitimidade democrática?
Qual a tua opinião?
Respondendo: deixa de ter legitimidade democrática, porque isso é sintoma que há alienação da democracia e do próprio sistema democrático.As pessoas podem não votar por dois motivos: a extrema confiança na classe política, seja ela qual for (o que parece existir em algumas democracias nórdicas) ou porque se estão a borrifar para isso, uma vez que não reconhecem qualquer valor à política (a abstenção que temos). O voto é o mecanismo por excelência da participação democrática, se não há voto há alienação dessa participação. De qualquer modo, votar nos representantes políticos é de uma ordem diferente de votar nestas matérias, como o aborto ou qualquer outro tema legal/ético (clonagem, pena de morte, eutanásia, liberalização das drogas leves, divórcio, relações homossexuais, etc., etc. - reconhece ao povo que temos legitimidade para votar, vinculativamente, sobre estas matérias?)
Quanto à questão do aborto, respondo com outra pergunta: lembra-se que estamos numa democracia representativa e de quais são os três poderes que nos regem? Os poderes existem porquê?
De qualquer modo, o senhor tenta virar o bico ao prego, tentando insinuar que eu defendo que o povo não tem legitimidade para votar; não foi isso que eu disse, o que eu disse é que o voto do povo, que pode ser tido em conta (acrescento), não pode ser vinculativo em todas as matérias.
Os 50% não é justificação nenhuma, é a regra da legislação que temos, a qual foi sublinhada pelo PR antes, repito, antes do referendo de 98.
Era exactamente este tipo de explicitação que eu pretendia que fizesses, uma vez que no outro comentário, havia de facto possibilidade de interpretar de maneira "enviezada" a tua opinião.
Com a quantidade de gente que lê comentários na diagonal e até notras linguas latinas, há que ter cuidado com o que escrevemos e explicitar tudo timtim por timtim. Senão ainda dizem que temos ambições políticas.
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